Da
possibilidade de aprovação dos atos de concentração econômica pelo decurso do
tempo no âmbito do Conselho Administrativo de Defesa Econômica.
The
possibility of approval of the merger by the economic course of time under the
Administrative Council for Economic Defense.
Por
Leonardo
Vizeu Figueiredo
Procurador
Federal
Especialista
em Direito Público pela UNESA/RJ
Especialista
em Direito do Estado pelo CEPED/UERJ
Mestre
em Direito pela UGF
Professor
de Direito Econômico da Universidade Santa Úrsula
Professor
Substituto da Universidade Federal Fluminense (2006 – 2008)
Professor
palestrante de Direito Constitucional da EMERJ
Professor
de Direito Constitucional da UNIPLI
Professor
de Direito Econômico da UNIGRANRIO (2011)
Professor
de Direito Constitucional e Internacional Privado da FACHA
PALAVRAS CHAVES: DIREITO ECONÔMICO.
DIREITO CONCORRENCIAL. SISTEMA BRASILEIRO DE PROTEÇÃO À CONCORRÊNCIA. DEVIDO
PROCESSO LEGAL. DIREITO AO PROCESSO RÁPIDO E COM DURAÇÃO RAZOÁVEL.
KEYWORDS: ECONOMIC LAW. COMPETITION LAW. BRAZILIAN SYSTEM PROTECTION OF
COMPETITION. DUE PROCESS LEGAL. FAST AND PROCESS RIGHT TO LIFE WITH REASONABLE.
Resumo:
Recentemente, a
República Federativa do Brasil promoveu uma profunda reestruturação de todo o
seu Sistema de Proteção à Concorrência. Objetivou tornar a análise dos atos de
concentração econômica mais célere e eficiente, bem como a investigação das
infrações da ordem econômica mais segura e competente.
Um dos institutos de
maior polêmica e celeuma que foram previstos foi a possibilidade de aprovação
tácita dos atos de concentração
econômica pelo decurso do tempo em virtude da não observância dos prazos
previstos para tanto.
Tal dispositivo restou
vetado por parte da Presidência da República, por considerar a redação
originária por demais genérica, o que daria margem a interpretações
demasiadamente extensivas e, consequentemente, prejudiciais à Fazenda Pública e
aos interesses nacionais.
Todavia, a Procuradoria
Federal junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica fixou interpretação
histórica e sistemática da Lei nº 12.529, de 2011, no sentido de manter o
instituto da aprovação tácita, ainda que a previsão tenha sido vetada pela
Presidência da República.
Destarte, o presente
artigo procura analisar a juridicidade da manifestação da Procuradoria Federal
junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica, face a Constituição da
República Federativa do Brasil.
Summary:
Recently, the Federative Republic of Brazil launched a deep restructuring
of its entire Protection System Competition. Aimed to make the analysis of
economic concentration acts faster and more efficient, as well as the
investigation of violations of the economic order more secure and competent.
One of the largest institutes of controversy and uproar that were foreseen was
the possibility of tacit approval of the merger by the economic course of time
due to non-observance of deadlines for both.
Such a device was left vetoed by the Presidency of the Republic,
considering the original wording too generic, which would give rise to
interpretations too extensive and therefore prejudicial to the State and
national interests.
However, the attorney with the Federal Administrative
Council for Economic Defense set historical and systematic interpretation of
Law No. 12,529, of 2011, in order to maintain the institute's tacit approval,
even though the weather has been vetoed by the president
Thus, this article seeks to analyze the legality of
the manifestation of Attorney with the Federal Administrative Council for
Economic Defense, against the Constitution of the Federative Republic of
Brazil.
1.
Introdução.
O presente artigo
objetiva promover uma análise da reforma estrutural do Sistema Brasileiro de
Proteção à Concorrência promovida pelo advento da Lei nº 12.529, de 2011,
especificamente, no que se refere à possibilidade de aprovação tácita dos atos
de concentração econômica face ao decurso do tempo previsto na legislação para
tanto.
Assim, se propõem a
verificar a atual estrutura orgânica do Conselho Administrativo de Defesa Econômica,
definindo o papel de cada um de seus órgãos internos.
Ato contínuo, passa ao
estudo do atual sistema processual estabelecido na Lei nº 12.529, de 2011,
especificamente para a análise dos atos de concentração econômica.
Por fim, objetiva
estabelecer os limites e o alcance normativo do veto presidencial ao instituto
da aprovação automática, bem como se subsiste a possibilidade de aplicação do
mesmo, em exercício de hermenêutica sistemático-histórica face ao disposto na
Constituição da República Federativa do Brasil.
2.
O Sistema Brasileiro de Proteção à Concorrência.
A relevância do tema Direito
Econômico e Defesa da Concorrência explica e justifica a continuada
preocupação com o aperfeiçoamento da legislação e do aparelhamento estatal
brasileiro, sem o que se torna extremamente dificultada, de um lado, a
atividade econômica nos moldes de nossa Constituição Econômica (arts. 170 a
181, CRFB) e, de outro, a atuação do Estado, como agente normativo e regulador
da atividade econômica no Brasil, ao qual compete fiscalizar, incentivar e
indicar diretrizes para o setor privado, determinando-as para o setor público.
Observe-se que, em que
pese o legislador constituinte orientar a ordem econômica no princípio da
subsidiariedade do Estado em relação ao particular, fundamentando-a na
livre-iniciativa, uma política de não intervenção mercadológica não deve
significar um aval aos agentes econômicos, que possa representar perversão à
liberdade individual destes, pelo seu uso abusivo irrefreado.
As políticas de defesa da
concorrência têm se constituído em um dos principais pilares da regulação do
livre mercado nas economias mais desenvolvidas e, de forma cada vez mais
proeminente, nas economias emergentes. Documento do Banco Mundial e OCDE (2002)[1]
chega a afirmar que a política de concorrência pode ser “vista como o quarto
alicerce do sistema de políticas econômicas de determinado governo, ao lado das
políticas monetária, fiscal e de comércio exterior”.
A Constituição da
República, no artigo 173, §4o, exige da lei a repressão ao abuso do
poder econômico. Trata-se de peça importante para a livre-concorrência, capaz
de trazer salutares consequências para a produção, a circulação e o consumo.
Assim, a fim de dar
efetividade às previsões legais sobre a Ordem Econômica do Estado, mormente no
que tange à defesa da livre-concorrência e da liberdade de mercado, foi
inicialmente estruturado o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, por
meio da Lei nº 8.884, de 1994, que contava com a seguinte estrutura:
a) Conselho
Administrativo de Defesa Econômica – CADE: que é uma entidade judicante,
vinculada ao Ministério da Justiça;
b) Secretaria
de Acompanhamento Econômico – SEAE: órgão consultivo de caráter
técnico-financeiro, subordinado ao Ministério da Fazenda; e
c) Secretaria
de Direito Econômico – SDE: órgão de caráter investigativo integrante do
Ministério da Justiça.
Atualmente, por meio da
nova legislação pátria o Sistema
Brasileiro de Proteção à Concorrência foi reestruturado, apresentando-se com o
seguinte mosaico:
a) Conselho
Administrativo de Defesa Econômica – CADE: autoridade concorrencial, com
competências ampliadas, composta dos seguintes órgãos:
a.1) Tribunal Administrativo de Defesa Econômica:
órgão judicante;
a.2) Superintendência-Geral: órgão executivo, de
monitoramento de mercado e investigativo, o qual substitui e incorpora as
atribuições da Secretaria de Direito Econômico;
a.3) Departamento de Estudos Econômicos: órgão de
assessoramento técnico em matéria econômica;
b) Secretaria
de Acompanhamento Econômico – SEAE: órgão consultivo de caráter
técnico-financeiro, subordinado ao Ministério da Fazenda, incumbido de promover
a advocacia e a cultura da concorrência.
Observe-se que a defesa
da concorrência é tema afeto não só à economia nacional, mas matéria de
interesse coletivo, afeta a toda a sociedade. Isto porque a manutenção salutar
da ordem econômica e, consequentemente, do próprio Estado, dentro das políticas
estabelecidas pelo Poder Público, está intimamente relacionada à garantia de
competição harmônica dos agentes econômicos que nele atuam.
Por concorrência
entende-se toda a ação de disputa saudável por espaço em determinado mercado
relevante realizada entre agentes competidores entre si. É competição pela preferência dos consumidores,
realizada entre fornecedores ou produtores de bens iguais ou semelhantes.
Trata-se, assim, do esforço empreendido pelo Estado na defesa da eficiência de
seu mercado interno e de sua Ordem Econômica. Isto é, a garantia que o Poder
Público assegura a seus agentes privados que melhor operem no mercado, no
sentido de dar ao consumidor final acesso a bens, produtos e serviços
qualitativamente diferenciados, por preços quantitativamente mais em conta. Com
o fomento da competição, aumentando-se naturalmente o número de agentes
privados concorrentes entre si, o Estado promove a pulverização do poderio
econômico entre os mesmos, de forma que nenhum consiga impor sua vontade sobre
os demais, tampouco sobre o Poder Público. Evita-se, assim, desequilíbrios que
possam conduzir a estruturas monopolizadas ou oligopolizadas, bem como a
captura de interesses.
A defesa da
concorrência, dentro de um contexto político-social, não é um fim em si mesmo,
mas um meio pelo qual se busca criar uma economia eficiente, por meio do
estabelecimento de políticas públicas e de um ordenamento jurídico específico
para tanto. Em um sistema econômico eficiente, os cidadãos dispõem da maior
variedade de produtos pelos menores preços possíveis e, consequentemente, os
indivíduos desfrutam de um nível máximo de bem-estar econômico. O objetivo
final da defesa da concorrência, portanto, é tornar máximo o devido processo
competitivo e, por corolário, o nível de bem-estar econômico da sociedade.
Economias competitivas são, também, uma condição necessária para o
desenvolvimento econômico sustentável de uma Nação, a longo prazo. Frise-se que
é objetivo fundamental da República brasileira o desenvolvimento nacional.[2]
Nesse ambiente econômico, dentro do cenário jurídico propício, as empresas
defrontam-se com os incentivos adequados para aumentar a produtividade e
introduzir novos e melhores produtos, gerando crescimento econômico e
desenvolvimento nacional. Oportuno destacar que tais valores encontram-se
devidamente incorporados à Lei Fundamental brasileira, sendo erigidos ao status
de norma constitucional de eficácia limitada, a teor do disposto no artigo 219
da CRFB, sendo o mercado interno patrimônio nacional e sua salutar manutenção,
garantindo-se o devido processo legal competitivo, fator determinante para o
desenvolvimento social, econômico e cultural da Nação, e instrumento garantidor
para o bem-estar coletivo.
Historicamente, dentro
do modelo estatal liberal, a concorrência pressupunha, tão somente, uma
pluralidade de agentes atuando dentro de um mesmo mercado. Todavia, o exercício
sem limites da liberdade de concorrência gerou concentração de mercados nas
mãos dos agentes mais fortes e a consequente eliminação dos mais fracos, fato
que levou o Estado a repensar seu papel diante da ordem econômica, atuando no
sentido de intervir na liberdade de mercado para garantir a coexistência
harmônica dos diversos agentes que nele atuam, independente do poderio
econômico que representam.
Como ensina Luís S.
Cabral de Moncada, sob um ponto de vista sociológico, a defesa da concorrência
traduz-se na garantia de escolha racional de consumo; sob uma ótica
eminentemente política, significa salvaguardar o Estado da imposição arbitrária
de interesses privados, por parte dos agentes detentores de poder econômico.[3]
Para tanto, mister se
faz a adoção de uma série de mecanismos próprios, que vão desde a adoção de um
planejamento econômico respectivo, no qual se priorize a edição de um
ordenamento jurídico específico para estimular a concorrência e promover sua
respectiva defesa, até a atuação de polícia administrativa, em caráter
repressivo às condutas abusivas, interferindo na orbe do exercício dos direitos
e garantias individuais dos respectivos agentes, em prol do interesse da
coletividade.
Neste sentido, o
ilustre doutrinador lusitano[4] nos
ensina que:
(...) a defesa da concorrência entre as unidades
produtivas compreende nos nossos dias um conjunto ordenado e homogêneo de
política econômica, muito para além das normas de polícia. O legislador partiu
do princípio de que a concorrência se não desenvolve espontaneamente entre as
empresas participantes do mercado, não lhe competindo tão só estabelecer um
conjunto de regras tendo por objeto simplesmente a prevenção e repressão de
situações em que o comportamento das empresas lesam intoleravelmente certos interesses
públicos. Torna-se necessário para além disso organizar normativamente um
regime de concorrência através do estabelecimento e defesa de um conjunto de
normas de política econômica visando certos objetivos tais como um alto volume
de emprego, ampla capacidade produtiva, uma relativa estabilidade monetária etc.
(...) considerado só alcançáveis no quadro institucional de um mercado aberto
na maior medida possível a todos os agentes econômicos e consumidores
(grifamos).
No Brasil, ainda que a
legislação inicial sobre a matéria remonte aos anos 60, apenas ao longo do
último decênio, a defesa da concorrência passou a assumir caráter prioritário
no contexto das políticas públicas. Até então, as características que marcaram
a economia brasileira ao longo de décadas – forte presença do Estado, recurso a
controle de preços, elevado nível de proteção à indústria nacional, altos
índices de inflação – eram incompatíveis com uma política eficaz de defesa da
concorrência.
Observe-se que a
fixação de políticas públicas para defesa da concorrência e da liberdade de
mercado denota que o exercício das liberdades individuais deve ser disciplinado
de forma racional pelo Estado, de modo a garantir que o consumidor, parte
hipossuficiente no ciclo econômico (produção, circulação e consumo) e o próprio
Poder Público, não fiquem à mercê de medidas arbitrárias impostas pelos agentes
detentores de poder econômico.
Outrossim, a defesa da
concorrência deve levar em conta as diferenças naturais dos agentes econômicos
e respectivos mercados, devendo ser efetuada de forma heterogênea, de maneira a
atender as necessidades e interesses coletivos em cada caso concreto, fato que
denota o alto grau de abstração que suas normas e regras necessitam, devendo
sua aplicação prática decorrer de um ponderado exercício de hermenêutica a ser
efetuado em cada hipótese sub judice.
3.
Evolução do Direito de Proteção à Concorrência
3.1.
Direito Comparado
Para uma ideia da
relevância do tema no mundo contemporâneo, a proteção ao devido processo
competitivo é questão de segurança econômica nos países que possuem empresas
que atuam a nível global, sendo fator decisivo para a atração de investimentos
privados.
Assim, mister se faz,
inicialmente, a analise da origem e da evolução dos sistemas de concorrência
nos Estados Unidos da América e na União Europeia, como meio de se entender,
contextualmente, a relevância do Sistema Brasileiro de Proteção à Concorrência.
A necessidade de se
proteger as relações comerciais surgiu com o intercâmbio entre as Nações. Por
sua vez, a necessidade de se proteger a competição entre as empresas surgiu com
a revolução industrial. As primeiras legislações de proteção à concorrência
buscavam coibir a pratica de trust, termo derivado do termo inglês trustie,
que se tratava de um acordo celebrado entre duas ou mais empresas para
combinação de estratégias, a fim de preservarem-se no mercado, ainda que em
detrimento dos demais participantes. Por óbvio, com a eliminação dos
concorrentes diretos, ficava fácil para os oligopólios resultantes imporem seus
interesses econômicos ao Estado e aos consumidores, gerando efeitos perniciosos
e deletérios para a ordem econômica. Assim, o Canadá editou em 1889 o Competition
Act, que foi a primeira lei antitruste do mundo.
A legislação canadense
objetivava, inicialmente, a prevenção
e repressão de estratégias combinadas formadas para restrição do comércio, tais
como a fixação de preço ou restrição na circulação de mercadorias.
Posteriormente, em 1910, por meio da edição do Combines Investigation Act, que ampliou as competência do Tribunal
de Competição para análise e julgamento de estruturas de mercado como fusões e
monopolização. Em 1986, foi promivida uma grande reforma na legislação
canadense, objetivando promover a eficiência e adaptabilidade da economia
canadense, aumentar a participação canadense no comércio exterior, assegurar
maior participação as pequenas e médias empresas, manter a oferta de preços em
patamares acessíveis aos consumidores.
A estrutura das autoridades concorrenciais canadense compreende:
a) Director of Investigation and Research
(Diretor de Investigação e Pesquisa): responsável pela instauração e condução
dos inquéritos de investigação;
b) Bureau of Competition Policy (Gabinete
de Política da Concorrência): com funções auxiliaries ao Director of Investigation and Research, competindo, ainda, zelar
pelo fiel cumprimento do Competition Act, assim como disseminar a
advocacia da concorrência;
c) Court
competitionI (Tribunal da
Concorrência): tribunal responsável pelo julgamento das condutas e das
estruturas de mercado;
d) Attorney General (Procuradoria Geral): responsável por
promovera apuração dos ilícitos concorrenciais em matéria penal.
Em 1890, os Estados
Unidos da América editaram sua lei antitruste, a Lei federal de 2 de julho de
1890, também conhecida como Sherman Act, através do Presidente Harrison
e da iniciativa do senador John Sherman. A partir da legislação
norte-americana, passou-se a proibir expressamente a combinação ou conspiração
no sentido de restringir o negócio ou o comércio (parágrafo 1° do Sherman
Act), bem como o monopólio e a sua tentativa (parágrafo 2º do Sherman
Act).
Em virtude do
aperfeiçoamento e da evolução do uso contínuo dos mecanismos de mercado, os
Estados Unidos da América editaram, no ano de 1914, o Clayton Act com o
fito de tornar mais clara a legislação de proteção à concorrência, dando mais
força ao Sherman Act. Assim, passaram a coibir os contratos em cadeia,
declararam ilegais a discriminação de preços e a exclusividade de negócio, bem
como as fusões resultantes da aquisição de ações dos concorrentes. Objetivaram,
destarte, a proteção às pequenas e médias empresas, sendo que, tais regras, não
eram proibitivas per si, mas, tão somente, quando pudessem prejudicar,
potencial ou efetivamente, o devido processo competitivo. Outrossim, criaram,
no Clayton Act, o Federal Trade Comission, ente guardião da
concorrência, atuante até os dias de hoje.
Atualmente, o Sistema
Norte-americano de Proteção à Concorrência conta com a seguinte estrutura
governamental:
a) Divisão
Antitruste (Antitrust Division) do Departamento de Justiça dos Estados
Unidos: promove e protege o devido processo competitivo, garantindo o fiel
cumprimento das leis antitruste;
b) Comissão
Federal de Comércio (Federal Trade Comission): supervisiona a política
antitruste e, basicamente, atua eliminando as propagandas enganosas que maculem
as opções consumeristas de compra.
No continente europeu,
o tema proteção à concorrência somente passou a ter relevância com a assinatura
do Tratado de Roma, em 1957, com o início da Comunidade Econômica Europeia.
Assim, com o processo de integração econômica e aquecimento do intercâmbio
entre os Estados signatários, o devido processo competitivo passou a ser
devidamente tutelado pelas autoridades europeias, como meio de se assegurar a
livre-iniciativa, necessária para a consolidação de economias de mercado. O
Sistema de Proteção à Concorrência da Europa conta com uma atuação conjunta da
Comissão Europeia, na qualidade de autoridade antitruste administrativa, bem
como do Tribunal de Justiça Europeu e da Justiça de 1ª Instância.
Outrossim, diversos
signatários do Tratado de Roma, de 1957, individualmente, editaram leis
próprias de proteção a concorrência. Em 1948, o Reino Unido editou o Monopolies and Restrictive Practices Act
para investigar as condutas restritivas da concorrência no mercado. Por sua
vez, em 1956, foi editado o Restrictive
Trade Practices Act com o fito de coibir os acordos restritivos da
concorrência. Em 1973, por meio do Fair
Trading Act, a legislação concorrencial foi consolidada. Em 1998, por meio
da edição do Competition Act, as
autoridades concorrências do Reino Unido foi estruturada da seguinte forma:
a) Office of the Director General of Fair Trade
(Escritório do Diretor-Geral de Comércio Equitativo): responsável pela coleta
de dados e informações do mercado e dos agentes privados;
b) Monopolies and Mergers Commission
(Comissão de Monopólios e Concentrações): responsável pela condução das
investigações;
c) Court of
Restrictive Practices (Tribunal de
Práticas Restritivas): tribunal responsável pelo julgamento das condutas e das
estruturas de mercado.
Na Alemanha, em 1958,
foi editada a Lei sobre Restrições a Concorrência (Gesetz über
Wettbewerbsbeschränkungen), o qual foi ampliado em 1973 para
controle de fusões e aquisições de empresas. Sua principal autoridade
concorrencial é o Bundeskartellamt (Serviço Federal da Concorrência),
responsável pela investigação e julgamento de condutas consideradas abusivas.
Suas decisões são passíveis de revisão por parte da Berufungsgericht
(Corte de Apelação), sob aspectos jurídico-econômicos, e por parte da Bundesgerichtshof
(Corte Suprema Federal), tão-somente em aspectos legais. As fusões e aquisições
empresariais são analisadas e aprovadas pela Deutsch Monopolkommission
(Comissão Alemã de Monopólio), podendo, em casos excepcionais, ser apreciados e
autorizados pelo Ministério da Economia.
Dada sua tradição
intervencionista, a França somente introduziu uma cultura de mercado em 1977,
quando criou a Comissão da Concorrência, órgão independente e de assessoramento
técnico do governo. Com a edição da Lei de Regulamentação da Liberdade de Venda
e da Concorrência (Loi sur la liberté de la réglementation de la vente et la
concurrence), em 1986, a França criou entes responsáveis
pela defesa da concorrência, a saber:
a) Conseil de la Concurrence (Conselho da
Concorrência): responsável por apurar e julgar as práticas retritivas;
b) Cour
d'appel (Corte de Apelação): segunda instância de
julgamento;
c) Direction Générale de la Concurrence, Consommation et
Répression des Fraudes
(Diretoria Geral da Concorrência, do Consumo e da Repressão das Fraudes):
tribunal responsável pelo julgamento das condutas e das estruturas de mercado.
3.2.
Direito pátrio.
No Brasil, uma regulação
de caráter mais genérico dos mercados se inicia em 1937 com a vertente da
chamada “defesa da economia popular”, mais integrada com o espírito de uma
economia marcada por forte intervenção do Estado na economia, especialmente no
controle de preços. Passa por um período em que são lançadas tanto legislações
nessa mesma linha como a criação da COFAP (Comissão Federal de Abastecimento e
Preços) em 1951, a SUNAB (Superintendência Nacional de Abastecimento (SUNAB) em
1962 e o CIP (Conselho Interministerial de Preços (1962), como também diplomas
legais cuja tônica se aproxima mais de um modelo de “defesa da concorrência”,
pelo qual não se joga contra, mas a favor do bom funcionamento do livre
mercado, coibindo seus abusos e corrigindo suas falhas, o que foi o caso da Lei
nº 4.137, de 1962, que criou o CADE (Conselho Administrativo de Defesa
Econômica).
Em 1994, a tônica da
vertente da “defesa da concorrência” se consolida com a Lei nº 8.884/94, a qual
vem regulando o funcionamento do sistema hoje existente com razoável sucesso.
Não é casual o fato de a aprovação de tal Lei ser contemporânea a um período de
reformas da economia brasileira, como a desregulamentação, a privatização e a
abertura dos mercados ao comércio exterior. Não há dúvida que o sentido prático
de uma legislação de defesa da concorrência está inevitavelmente associado a
uma mudança mais geral do paradigma da forma de intervenção do Estado na esfera
econômica, agora mais voltada a garantir que as forças de mercado sejam
direcionadas ao estímulo do empreendedorismo com eficiência e ao bem estar do
consumidor.
De 1994 até a
atualidade, o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC) passou por um
fértil processo de aprendizado e evolução institucional. A análise econômica
ficou mais refinada. Pode-se afirmar, sem margem a maiores dúvidas, hoje que a
aplicação da legislação de defesa da concorrência não distoa das melhores
práticas internacionais, o que constitui uma constatação contundente do
Relatório dos pares da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE)
de 2005 específico para o Brasil nessa
área: “Apesar das sérias deficiências, o SBDC realizou progressos substanciais
durante os últimos cinco anos, implementando uma sólida política de concorrência
no Brasil”.
No entanto, apesar de a
Lei nº 8.884, de 1994, ter sido considerada moderna e um avanço na modernização
econômica da ordem jurídica brasileira, não deixando a desejar em relação a
outras jurisdições internacionais, a abertura do debate para sua reforma
evolutiva foi fundamental para adequar a legislação brasileira as novas
necessidades oriundas da constante dinâmica evolutiva do mercado.
Por essa razão, o
debate sobre a remodelação do SBDC e de sua estruturação orgânica, quais sejam,
o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), a Secretaria de Direito
Econômico do Ministério da Justiça (SDE/MJ) e a Secretaria de Acompanhamento
Econômico do Ministério da Fazenda (SEAE/MF), ocupou posição de destaque no
meio acadêmico e demandou grande labor das autoridades legislativas no Brasil,
gerando calorosos debates entre a atuante e crescente comunidade de agentes com
interesse sobre o tema no país.
Como mudanças
estruturais mais profundas não acontecem e nem devem acontecer de forma
açodada, foi natural e salutar que a reforma do Sistema Brasileiro de Proteção
à Concorrência fosse discutida e amadurecida dentro e fora das esferas
governamentais, com a oitiva de todos os segmentos sociais e mercadológicos
envoltos. Isto porque, as reformas institucionais com maior probabilidade de êxito
são aquelas cujo objetivo e regras são razoavelmente bem aceitas e
compreendidas pela grande parte dos agentes afetados direta e indiretamente e
tal grau de consenso apenas é obtido após um período suficientemente grande de
tempo para discussão e amadurecimento de ideologias.
Sobre a atual
legislação brasileira de proteção a concorrência, podemos destacar que os art.
1º a 19 mantêm as atuais regras sobre aplicação territorial da Lei e
reestruturam o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), que passa a
ser composto de um Tribunal Administrativo, uma Superintência-Geral e um
Departamento de Estudos Econômicos.
De forma genérica,
pode-se afirmar que o Tribunal absorve as antigas atribuições do Plenário do
CADE, que são as de julgar os processos administrativos de infração à ordem
econômica e de análise de atos de concentração econômica.
A
Superintendência-Geral, por sua vez, assume as atribuições da extinta
Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça (SDE), no que tange à
defesa da concorrência. São, em regra, poderes para iniciar processos e
conduzir investigações, a fim de colher provas de condutas e efeitos
caracterizadores de infração à ordem econômica ou de danos derivados de
concentrações empresariais.
Papel mais destacado
foi conferido à Superintendência no tocante à análise de atos de concentração
econômica: enquanto a Secretaria de Direito Econômico apenas confeccionava
parecer não vinculante, a Superintendência pode propor acordo que altere os
termos da união empresarial, a fim de que seja aprovada. Os termos do acordo
serão analisados pelo Tribunal.
Destaca-se, ainda, que
o Superintendente, ao contrário do antigo Secretário de Direito Econômico,
detém mandato fixo, após regular nomeação pelo Presidente da República e
aprovação do Senado Federal, da mesma forma que os Conselheiros do Tribunal
interno ao CADE.
O Departamento de
Estudos Econômicos possui função essencialmente técnica, sem que seu titular, o
Economista-Chefe, possua poderes decisórios.
A criação do
Departamento de Estudos Econômicos do CADE agiliza os processos, visto que esse
departamento substitui o anterior papel processual da SEAE, que era o de
elaborar pareceres nos processos de competência do CADE. Os pareceres do
departamento não são exigidos por lei e só serão confeccionados se houver
solicitação do Superintendente-Geral, do Presidente do Tribunal, do
Conselheiro-Relator, do Plenário do Tribunal ou, ainda, por decisão do próprio
Economista-Chefe.
Ao lado do CADE,
integra a estrutura do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência a
Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda (SAE), a qual
deixa de elaborar pareceres em análise de atos de concentração econômica e
passa a adotar, explicitamente, o papel de advocacia da concorrência, com ampla
possibilidade de opinar sobre aspectos concorrenciais de normas e políticas em
vigor.
Desta forma, a SEAE se
tornara um importante órgão de apoio as ações de preservação da competição e
terá como competência emitir opiniões quanto a promoção da concorrência, sobre
propostas de alterações de atos normativos de interesse geral dos agentes
econômicos, de consumidores ou usuários dos serviços prestados submetidos a
consulta publica pelas agências reguladoras e, quando entender pertinente,
sobre os pedidos de revisão de tarifas e as minutas, bem como a de propor a
revisão de leis, regulamentos e outros atos normativos da administração pública
federal, estadual, municipal e do Distrito Federal que afetem ou possam afetar
a concorrência nos diversos setores econômicos do Pais.
Quanto à juridicidade,
podemos destacar que a atual legislação brasileira de proteção à concorrência
traz os seguintes aspectos normativos:
a) inovação,
porque reestrutura sistemicamente todo o aparato estatal envolto da defesa da
concorrência;
b) efetividade
e coercitividade, representadas pelo poder vinculante de suas decisões ao caso
concreto, bem como pela autonomia desta em relação ao Executivo;
c) espécie
normativa adequada, já que a defesa da concorrência e a repressão ao abuso de
poder econômico devem ser disciplinados por lei ordinária, não havendo reserva
constitucional de lei complementar para tanto; e
d) generalidade,
uma vez que as normas se aplicam, indistintamente, a todas as pessoas, físicas
e jurídicas, estas de direito privado ou público.
Ao Ministério Público
Federal – MPF (art. 20), que atua junto ao CADE, foi estabelecida a função de
emitir parecer em processo administrativo que apure infração à ordem econômica,
mas foi suprimida a sua participação nos demais tipos de processo
administrativo, em especial nos atos de concentração econômica.
No que se refere ao
órgão de consultoria jurídica e representação judicial e extrajudicial, a
saber, a Procuradoria Federal Especializada do CADE, vinculada a Advocacia
Geral da União, a elaboração de pareceres pela Procuradoria nos processos de
competência do Tribunal deixa de ser uma exigência (peça que era essencial à
instrução) e passa a ser uma opção, exercida por decisão do Conselheiro-Relator
ou do Superintendente-Geral. Isso confere maior agilidade à instrução e ao
julgamento, mesmo porque a solicitação de tal parecer não provocará a suspensão
de prazo de análise do processo, nem impedirá a sua inclusão em pauta para
julgamento.
4.
Objetivos e Finalidades
Atualmente, a proteção
a concorrência na República Federativa do Brasil é realizada por um aparato
estatal formado por um ente judicante-concorrencial e um órgão auxiliar, a
saber: o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE e a Secretaria de
Acompanhamento Econômico – SEAE.
Cabe ressaltar que,
durante a vigência da Lei nº 8.884, de 1994, a estrutura do Sistema Brasileiro
de Proteção à Concorrência era composta pelo Conselho Administrativo de Defesa
Econômica, autarquia sob regime especial vinculada ao Ministério de Justiça,
que atuava meramente na qualidade de tribunal administrativo, pela Secretaria
de Direito Econômico, órgão subordinado ao Ministério da Justiça, com
atribuições investigativas e instrutórias, e a Secretaria de Acompanhamento
Econômico, órgão subordinado ao Ministério da Fazenda, atuante para fins de
assessoramento técnico. Para fins didáticos, apresentaremos a antiga
estruturação do Sistema, bem como a atual, mostrando as principais diferenças e
inovações.
O objetivo principal do
Sistema de Proteção a Concorrência é a promoção de uma economia competitiva por
meio da prevenção e da repressão de ações que possam limitar ou prejudicar a
disputa saudável e transparente por parcela de mercado relevante, com base na
legislação vigente. Orienta-se nos princípios constitucionais de liberdade de
iniciativa (art. 1º, I, in fine, c/c
art. 170, caput), livre concorrência
(art. 170, IV), função social da propriedade (art. 170, III), defesa dos
consumidores (art. 170, V), além da repressão ao abuso do poder econômico (art.
173, §4º).
Assim, podemos ementar
a atuação do Sistema Brasileiro de Proteção a Concorrência em três vertentes
basilares, a saber:
a) o controle
de estruturas de mercado: via apreciação de fusões e aquisições entre empresas
(atos de concentração);
b) a repressão
a condutas anticompetitivas; e
c) a promoção
da cultura da concorrência.
Para realização de suas
atribuições legais e consecução de sua missão finalística, o Sistema Brasileiro
de Proteção a Concorrência, seus órgãos e membros, possuem uma série de
prerrogativas legais, a fim de lhe garantir plena autonomia administrativa e
independência técnica na consecução de suas atribuições legais e finalidades
teleológicas.
As decisões do CADE não
comportam revisão no âmbito do Poder Executivo, podendo ser revistas apenas
pelo Poder Judiciário, com base no princípio do and justice for all ou na inafastabilidade da justiça (art. 5º,
XXXV, CRFB).
As denúncias de
condutas infratoras à ordem econômica, bem como as análises dos atos de
concentração para fins de controle de estruturas de mercado serão,
inicialmente, encaminhadas à Superintendência Geral do CADE, que, se houver indício suficiente de autoria e
materialidade do fato, iniciará o procedimento preparatório de inquérito administrativo ou o inquérito
administrativo para apuração de infrações da ordem econômica, podendo, ainda,
instaurar diretamente o processo administrativo sancionador. Nesta fase
objetiva-se a produção de provas, por meio da coleta de elementos fáticos, bem
como da realização de pesquisas e da descrição das condutas narradas. Caso se
faça necessário a análise e verificação das consequências econômicas que podem
vir a ocorrer, solicitar-se-á manifestação técnica ao Departamento de Estudos
Econômicos do CADE ou a Secretaria de Acompanhamento Econômico, que emitirão
parecer de cunho técnico.
Encerrados os trâmites
procedimentais acima, deverão os autos ser remetidos ao Tribunal Administrativo
de Defesa Econômica do CADE, que tem a competência legal para, com base nos
elementos levantados, julgar o potencial lesivo da ocorrência sub judice.
Assim, deverá manifestar-se, conclusivamente, sobre a abusividade ou não da
conduta, em face dos princípios constitucionais norteadores da ordem econômica,
observando-se, ainda, as previsões contidas na legislação vigente. Em caso de
configuração de conduta abusiva, deverá, ainda, determinar as providências
cabíveis para coibi-la ou repará-la.
4.1. Controle de estruturas de mercado
O controle de
estruturas, que visa submeter ao Sistema Brasileiro de Proteção a Concorrência
a apreciação sobre os atos empresariais que possam vir a representar
concentração e domínio de mercados.
Os atos de concentração
podem ter efeitos negativos e positivos sobre o bem-estar econômico, daí a
necessidade de sua apreciação e análise em cada caso concreto. Os efeitos
negativos decorrem de um eventual exercício de poder de mercado pela empresa
concentrada, podendo gerar aumento de preços, fundamentalmente. Outrossim, os
efeitos positivos derivam de economias de escala, de escopo, de redução de
custos de transação, entre outros, que podem proporcionar vantagens
competitivas para as empresas participantes. Mister se faz proceder, então, a
uma análise dos custos e dos benefícios dos atos de concentração, podendo ser
aprovados aqueles que gerarem efeitos líquidos não negativos para o bem-estar
econômico e a reprovação ou a adoção de medidas corretivas em relação àqueles
que gerarem efeitos líquidos negativos.
É defeso aos agentes
privados, total ou parcialmente, a pratica de mecanismos de mercado que se
traduzam em atos de concentração que:
a) impliquem
eliminação da concorrência em parte substancial de mercado relevante;
b) possam
criar ou reforçar uma posição dominante; ou
c) possam
resultar na dominação de mercado relevante de bens ou serviços.
Poderão, todavia, ser
autorizados pelo Tribunal Administrativo de Defesa da Concorrência os atos que
concentração que promovam a eficiência econômica e o bem-estar dos
consumidores, bem como aqueles cujos benefícios não possam ser obtidos de outro
modo que implique menores restrições ou prejuízos à livre concorrência e,
ainda, compensem as restrições causadas à livre concorrência, devendo ser
compartilhados entre os seus participantes e os consumidores ou usuários
finais.
Por sua vez, os atos de
concentração são todos aqueles que, no caso concreto, visam a qualquer forma de
concentração econômica (horizontal, vertical ou conglomeração), seja por meio
de fusão ou de incorporação de empresas, de constituição de sociedade para
exercer o controle de empresas ou qualquer forma de agrupamento societário.
Por concentração
horizontal entende-se a concentração que envolve agentes econômicos distintos e
competidores entre si, que ofertam o mesmo produto ou serviço em um determinado
mercado relevante. Concentração ou integração vertical traduz-se na
concentração que envolve agentes econômicos distintos, que ofertam produtos ou
serviços diversos, fazendo parte da mesma cadeia produtiva.
Conglomeração é a
concentração que envolve agentes econômicos distintos, que igualmente ofertam
produtos ou serviços diversos, podendo ou não ser complementares entre si, mas
que, certamente, não fazem parte da mesma cadeia produtiva. Genericamente, uma
conglomeração é saudável à competição, pois significa a “entrada” de uma empresa
em um determinado mercado de produto ou serviço. No entanto, uma conglomeração
pode ter efeitos nocivos à concorrência quando houver complementariedade entre
os produtos ou serviços envolvidos.
A atual legislação
define, exemplificativamente, como um ato de concentração os casos em que:
a) duas ou
mais empresas anteriormente independentes se fundem;
b) uma ou mais
empresas adquirem, direta ou indiretamente, por compra ou permuta de ações,
quotas, títulos ou valores mobiliários conversíveis em ações, ou ativos,
tangíveis ou intangíveis, por via contratual ou por qualquer outro meio ou
forma, o controle ou partes de uma ou outras empresas;
c) uma ou mais
empresas incorporam outra ou outras empresas; ou
d) duas ou mais
empresas celebram contrato associativo, consórcio ou joint venture.
Vale ressaltar que a
atual legislação não considera como atos de concentração, as transações e as
negociações de ações, quotas ou outros títulos, por conta própria ou de
terceiros, em caráter temporário, ou participações adquiridas para fins de
revenda, desde que os adquirentes não detenham o poder de determinar, direta ou
indiretamente, ou ainda a capacidade de influenciar o comportamento
concorrencial da empresa adquirida ou apenas exercerem o direito de voto com o
objetivo exclusivo de preparar a alienação, total ou parcial, da empresa
adquirida, seus ativos ou dessas participações.
Por sua vez,
expressamente prevê a possibilidade de acordo entre o CADE e a requerente para
a aprovação de atos de concentração, com cláusulas visando a eliminação dos
efeitos nocivos à ordem econômica.
Assim todos os atos de
concentração em que as partes envoltas tenham uma um faturamento acima de R$
400 milhões e a outra um faturamento superior a R$ 30 milhões deverão ser
prévia e obrigatoriamente submetidos à apreciação do CADE, sob pena de sanção
pecuniária, ficando expressamente vedada sua consumação.
Outrossim, caso a
instrução e julgamento do ato de concentração por parte do CADE não seja
concluída dentro dos prazo legais de natureza peremptória, o ato poderá ser
considerado tacitamente aprovado, nos termos a serem regimentalmente definidos,
podendo as empresas prosseguirem na sua concretização. Caso a Superintendência
Geral entenda necessário, o ato de concentração poderá ser declarado complexo, mediante
decisão fundamentada, o que permite eventual dilação de prazo para realização
de instrução complementar.
Casuisticamente, poderá
o CADE autorizar, a título precário e em caráter liminar, a concretização do
ato, impondo as condições que julgue necessárias para preservar a
reversibilidade do mesmo, visando manter a situação concorrencial anterior à
assinatura dos contratos e a fazer com que os interessados se abstenham, até o
julgamento, de praticar um conjunto de novos atos decorrentes do contrato já
realizado, quais sejam:
a) alterações
de natureza societária;
b) alterações
nas instalações físicas e transferência ou renúncia aos direitos e obrigações
relativos aos ativos, aí também incluídos marcas, patentes e carteira de
clientes e fornecedores;
c) descontinuar
a utilização de marcas e produtos;
d) alterações
nas estruturas, logística e práticas de distribuição e
comercialização;
e) mudanças
administrativas nas empresas que impliquem em dispensa de mão de obra e
transferência de pessoal entre seus estabelecimentos de produção, distribuição,
comercialização e pesquisa, quando caracterizadas como objetivando a integração
das empresas das requerentes;
f) interrupção
de projetos de investimento preestabelecidos em todos os setores de atividade
da empresa adquirida e de implementação de seus planos e metas de vendas.
Assim, sobre o controle
de atos de concentração econômica, a atual legislação trouxe três expressivas
inovações, que devem ser destacadas.
A primeira e polêmica
inovação reside no fato de que o controle passa a ser prévio, isto é, as
empresas que intencionem promover união empresarial devem aguardar a decisão
favorável do CADE, antes de realizarem a concentração econômica.
Para tanto, o CADE,
somadas as competências da Superintendência e do Tribunal, deve apreciar o
pedido em até 240 dias, sob pena de possível aprovação automática da operação e
apuração da responsabilidade civil, administrativa e penal dos membros do CADE,
nos termos a serem regimentalmente definidos. Tal prazo pode ser dilatado em
até 60 dias, a requerimento das empresas, ou em até 90 dias, a requerimento do
Tribunal.
A segunda inovação
permite que o CADE aprove atos de concentração econômica que causem danos
graves e substanciais à concorrência, desde que eficiências econômicas (ganhos
de produtividade e inovações tecnológicas) sejam produzidas pela união, sendo
garantido aos consumidores o repasse de parte relevante de tais benefícios. A
atual legislação, nesse sentido, em nada inovou, confiando ao Tribunal a
definição da política mais adequada a cada momento histórico, político e
econômico.
Pela lei revogada (Lei
nº 8.884, de 1994), o CADE não poderia autorizar uniões empresariais que
causassem danos exagerados à concorrência, ainda que ganhos de eficiência
econômica sejam produzidos. Também pela lei revogada, os consumidores deveriam
receber uma parte identicamente proporcional (50%, portanto) à parcela de
ganhos de eficiência econômica absorvida pelos produtores.
A terceira inovação é a
que altera o critério de apresentação de uniões empresariais: suprime-se o
critério de apresentação na hipótese de detenção de 20% ou mais de mercado
relevante, bem como se exige que a empresa a ser adquirida tenha, ao menos,
faturamento de R$ 30 milhões de reais.
Do ponto de vista
processual, merece destaque o fato de que o Superintendente-Geral poderá
aprovar ou impugnar o ato de concentração. Se o aprovar, qualquer interessado
poderá recorrer ao Tribunal, o qual poderá, ainda, avocar o processo. Se o
Superintendente-Geral o impugnar, o processo será encaminhado ao Tribunal.
O Superintendente-Geral
poderá, ainda, ofertar acordo em ato de concentração econômica, antecipando-se
a uma decisão do Tribunal sobre as condições necessárias para a aprovação da
união empresarial. Mas os termos do acordo serão, sempre, apreciados pelo
Tribunal.
A adoção do controle
prévio dos atos de concentração econômica coloca o Brasil na linha da
experiência internacional e impede a ocorrência de prejuízos econômicos
resultantes de desfazimento, a mando do CADE, de operação de união empresarial
já concluída pelas empresas participantes do ato de concentração econômica.
Tal regra, em tese,
amplia as chances de o CADE impor restrições legítimas à união empresarial que,
se já estivesse concretizada no plano dos fatos, talvez fosse aprovada pelo
CADE em razão dos custos de desfazimento envolvidos e de eventual temor do CADE
em assumir desgaste perante a opinião pública, como decorrência do cumprimento
de decisão que determine o desmanche da fusão ou aquisição.
4.2. Repressão a condutas
anticompetitivas
A repressão a condutas
anticoncorrenciais traduz-se na análise e verificação de condutas de empresas
que podem configurar infração à ordem econômica, conforme será tratado adiante.
Vale citar, a título
exemplificativo, as vendas casadas, os acordos de exclusividade e a prática de
cartel (adoção de conduta concertada entre empresas que atuam em um mesmo
mercado, por meio de fixação de preços, de divisão de mercados ou de
falseamento em licitações públicas). Nesses casos, a SBPC pode realizar
processo administrativo, ainda que em caráter preliminar, ou, igualmente,
instaurar processo administrativo, conforme o caso, para apurar os fatos.
No atual contexto
socioeconômico, a repressão a condutas anticompetitivas representa o grande desafio
à frente do SBDC. Tem-se priorizado os casos de condutas concertadas
multilaterais (cartéis), tanto no plano nacional como no internacional. Nesse
último caso, o propósito é verificar e identificar de que forma cartéis de
empresas multinacionais afetaram a economia e o consumidor nacional.
Universalmente reconhecidos como danosos a uma economia de mercado eficiente,
cartéis para fixação de preço ou divisão de mercado são um empecilho ao
desenvolvimento econômico, razão pela qual não podem ser tolerados, devendo o
Estado reprimir tal conduta.
Acerca do controle de
condutas anticoncorrenciais, também conhecido como análise das infrações da
ordem econômica, quatro inovações legislativas merecem destaque em relação ao
modelo revogado.
Primeiro, foi suprimida,
como infração, a conduta de impor preços excessivos, prevista no ordenamento
ulterior (art. 21, XXIV, da Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994).
Segundo, foi criada a
prescrição intercorrente no processo administrativo, a qual ocorrerá após três
anos de processo paralisado, pendente de julgamento ou despacho. Assim, a lei
de defesa da concorrência foi harmonizada com as normas aplicáveis a todos os
processos administrativos de natureza sancionatória, no âmbito da Administração
Pública Federal.
Terceiro, foram
ampliados, de forma substancial, os poderes de investigação atribuídos ao
Superintendente-Geral do CADE, para arquivar denúncias tratadas em procedimento
preparatório de inquérito administrativo, sem que se possa recorrer de tal
decisão ao Tribunal do CADE. Explica-se: ao receber a denúncia, o
Superintendente-Geral pode tratá-la por três tipos distintos de processo, à sua
escolha, por decisão discricionária:
a) procedimento
preparatório;
b) inquérito
administrativo; e
c) processo
administrativo.
Caso o
Superintendente-Geral escolha o primeiro tipo e decida, em seguida, arquivar a
denúncia, sua decisão é irrecorrível, isto é, o Tribunal não poderá, em
hipótese alguma, revê-la. Caso o Superintendente-Geral escolha o segundo tipo,
é admitida, tão-somente, a avocação do inquérito pelo Tribunal, mas o
interessado não poderá recorrer. Apenas se o Superintendente-Geral escolher o
terceiro tipo, o processo será necessariamente encaminhado ao Tribunal para
julgamento. Todavia, preservou-se o check and balances entre as
autoridades antitruste, assegurando que o Tribunal poderá rever qualquer
decisão da Superintendência-Geral, em qualquer tipo de processo, de ofício ou
por provocação.
Como mencionado, no
caso de inquérito administrativo arquivado pelo Superintendente-Geral do CADE,
foi suprimido o recurso de ofício cabível contra tal decisão no ordenamento em
vigor. O Tribunal poderá avocar o inquérito, mas nenhuma conduta comissiva é
exigida do Superintendente-Geral do CADE no sentido de encaminhar o inquérito arquivado
ao Tribunal. Isso visa assegurar que não serão encaminhados à deliberação do
Tribunal do CADE casos manifestamente insubsistentes.
Ademais, as denúncias
oferecidas pelo Congresso Nacional ou por qualquer de suas Casas, as quais
exigiam instauração imediata de processo administrativo pelo ordenamento
revogado, passam a ser tratadas, pelo atual legislação, como demandas a serem
investigadas pelo Superintendente-Geral do CADE, por meio de processo
administrativo ou de mero inquérito administrativo, este passível de
arquivamento sumário por ato do Superintendente-Geral do CADE, sem que recurso
algum possa ser proposto perante o Tribunal.
Foi garantida, todavia,
a plena revisibilidade, pelo Tribunal, de todas as decisões da
Superintendência-Geral. As denúncias oferecidas pelo Congresso Nacional deverão
ser investigadas e concluídas nos prazos legais. Ao contrário da legislação
revogada, a atual marca bem a diferença entre as diversas espécies de processos
administrativos.
O inquérito
administrativo é um procedimento de natureza inquisitorial, instaurado no
interessa das investigações. Já o processo administrativo será um procedimento
em contraditório, destinado a assegurar a ampla defesa. Mimetizando a distinção
existente no processo penal, o Inquérito Administrativo fará ás vezes do
Inquérito Policial e o Processo Administrativo stricto sensu fará as
vezes da Ação Penal. A importância de se iniciar as investigações pelo
Inquérito Administrativo é permitir maior flexibilidade – e portanto eficiência
– nas investigações. Para que a Ação Penal seja bem proposta, é preciso que
haja uma boa investigação no Inquérito Policial. Da mesma forma, para que o
Processo Administrativo seja exitoso, é preciso que uma boa investigação tenha
sido feita no âmbito do Inquérito Administrativo. Abrir uma Ação Penal sem
provas previamente coligidas e sistematizadas no Inquério Policial é fadá-la ao
fracasso. Pela mesma razão, o Projeto impede a instauração direta de Processo
Administrativo stricto sensu sem prévio Inquérito Administrativo.
Quarto, a medida
preventiva passa a ser admissível não apenas no processo administrativo, mas
também no inquérito administrativo. Também o compromisso de cessação de prática
passa a ser adotável não apenas no processo administrativo, mas também no
procedimento preparatório de inquérito e no inquérito administrativo, o que
deve permitir sua adoção não apenas pelo Tribunal, mas também pelo
Superintendente-Geral, o que hoje era vedado pela lei revogada, a qual não
permitia que o Secretário de Direito Econômico pudesse formular o compromisso
de cessação de prática.
4.3. Promoção da cultura da
concorrência.
A promoção da cultura
da concorrência refere-se ao papel educacional das autoridades concorrenciais
na disseminação da política de competição saudável na consciência coletiva de
mercado, e ao papel de, direta ou indiretamente, essas autoridades influírem na
formulação das demais políticas públicas, de modo a garantir que a concorrência
seja maximizada e incentivada.
Corresponde à atuação educativa e acadêmica dos órgãos do Sistema
Brasileiro de Defesa da Concorrência, com o objetivo de divulgação de temas
relacionados com o direito concorrencial aos setores que ordenam, aplicam e que
recebem os efeitos da aplicação concreta das normas antitruste, em especial
aqueles órgãos públicos. Trata-se da difusão da cultura da concorrência e do
conhecimento a respeito dos benefícios da livre concorrência (como preços
menores, qualidade superior de bens e serviços, além de um maior incentivo à
inovação) à sociedade, empresários, juízes, promotores públicos, legisladores e
administradores e reguladores.
As ações do SBDC nesse
âmbito ocorrem precipuamente de duas formas. A primeira – interna - é na forma
de consultoria e promoção de políticas públicas em defesa da concorrência em
órgãos governamentais como Ministério Público, Órgãos do Poder Judiciário,
Polícia. A segunda - externa – ocorre com o trabalho de conscientização da
sociedade civil através de instituições acadêmicas, entidades de classe,
câmaras de comércio.
No contexto de
advocacia interna, o relacionamento mais intenso entre o Ministério Público,
Advocacia-Geral da União, Polícia Federal e o SBDC constitui passo fundamental
para a melhoria das políticas públicas de defesa da concorrência.
Nos últimos 5 anos, a
Advocacia da Concorrência ganhou maior destaque e importância na atuação do
SBDC. Através de diversos projetos, buscou-se alavancar a difusão da cultura da
concorrência em todo o território nacional, a fim de alcançar toda a população
e território nacional através da conscientização da importância da proteção do
livre mercado. Nesse período, além da crescente atuação acadêmica e
governamental, o SBDC realizou projetos que ultrapassaram a atuação tradicional
da advocacia e atingiu diretamente a sociedade civil e empresarial. Criou-se,
portanto, uma rede de informações de modo a enraizar a idéia da concorrência na
cultura popular brasileira.
Destarte a atuação do
SBDC, deve observar a intensa interface entre a regulação econômica e a
promoção da concorrência, uma vez que esta pode ser alcançada por meio da
correção de falhas em estruturas reguladoras. Nesse sentido, merece destaque a
SEAE, tendo atuação expressiva nas discussões referentes à reestruturação de
vários setores da economia, entre eles aviação civil, energia elétrica,
transportes, saneamento e telecomunicações, bem como na constituição de um
marco regulador para concessões públicas, conforme já visto anteriormente.
Como resultado desse
empenho, o SBDC adquiriu grande respeito e reconhecimento da sociedade
brasileira e passou a ser pauta nos maiores fóruns de discussão governamental,
acadêmica e empresarial.
5. Estrutura
O Sistema Brasileiro de
Defesa da Concorrência é estruturado por meio de um mosaico formado pelo
Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE e pela Secretaria de
Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda.
O CADE é entidade
judicante com jurisdição em todo o território nacional, que se constitui em
autarquia federal, vinculada ao Ministério da Justiça, com sede e foro no
Distrito Federal, sendo constituído pelo Tribunal Administrativo de Defesa
Econômica, pela Superintendência-Geral e pelo Departamento de Estudos
Econômicos.
Além de sua estrutura
organizacional e do apoio técnico prestado pela Secretaria de Acompanhamento
Econômico, atuam junto ao CADE uma Procuradoria Federal Especializada,
vinculada a Advocacia Geral da União, órgão que detém a capacidade postulatória
para representar o CADE em juízo e fora dele, prestando-lhe, com exclusividade,
consultoria jurídica, bem como um órgão do Ministério Público Federal, que
oficia nos processos de controle de estruturas de mercado.
5.1. Tribunal
Administrativo de Defesa Econômica
O Tribunal
Administrativo se trata de órgão judicante, integrante da estrutura organizacional
do CADE. É composto por um Presidente e seis Conselheiros escolhidos dentre
cidadãos com mais de 30 (trinta) anos de idade, de notório saber jurídico ou
econômico e reputação ilibada, nomeados pelo Presidente da República, depois de
aprovados pelo Senado Federal.
Será dirigido pelo Presidente,
a quem compete a condução dos trabalhos de pauta, e composto por Conselheiros,
cujo mandado é de 4 (quatro) anos, não coincidentes, vedada a recondução.
5.2. Superintendência-Geral
O CADE conta em sua
estrutura com uma Superintendência-Geral, com 1 (um) Superintendente-Geral e 2
(dois) Superintendentes-Adjuntos, cujas atribuições específicas são definidas
em Regimento Interno.
O Superintendente-Geral
é escolhido dentre cidadãos com mais de 30 (trinta) anos de idade, notório
saber jurídico ou econômico e reputação ilibada, nomeado pelo Presidente da
República, depois de aprovado pelo Senado Federal, o qual avaliará se o mesmo
possui a qualificação técnica e moral necessária para o mister.
Seu mandato será de 2
(dois) anos, permitida a recondução para um único período subseqüente.
Aplicam-se ao Superintendente-Geral as mesmas normas de impedimentos, perda de
mandato, substituição e as vedações, aplicáveis ao Presidente e aos
Conselheiros do Tribunal Administrativo.
Os cargos de
Superintendente-Geral e de Superintendentes-Adjuntos são de dedicação
exclusiva, não se admitindo qualquer acumulação, salvo as constitucionalmente
permitidas, a saber, função de magistério, desde que haja compatibilidade
jornadas de trabalho semanal.
5.3. Departamento de Estudos Econômicos
O CADE é dotado de um
Departamento de Estudos Econômicos, dirigido por um Economista-Chefe, a quem
incumbirá elaborar estudos e pareceres econômicos, de ofício ou por solicitação
do Plenário, do Presidente, do Conselheiro-Relator ou do Superintendente-Geral,
zelando pelo rigor e atualização técnica e científica das decisões do órgão.
O Economista-Chefe é
nomeado, por ato conjunto, do Superintendente-Geral e do Presidente do
Tribunal, dentre brasileiros de ilibada reputação e notório conhecimento
econômico, podendo participar das reuniões do Tribunal, sem direito a voto.
Aplicam-se ao
Economista-Chefe as mesmas normas de impedimento aplicáveis aos Conselheiros do
Tribunal, exceto quanto ao comparecimento às sessões.
5.4. Secretaria de Acompanhamento
Econômico
Por sua vez, a
Secretaria de Acompanhamento Econômico – SEAE – é órgão consultivo, de
assessoramento técnico, especializado, ao CADE, ligado ao Ministério da
Fazenda, emitindo, para tanto, pareceres técnicos para subsidiar as decisões da
Autarquia. É o principal órgão do Poder Executivo encarregado de acompanhar os
preços da economia, subsidiar decisões em matéria de reajustes e revisões de
tarifas públicas, bem como apreciar atos de concentração entre empresas e
reprimir condutas anticoncorrenciais.
Outrossim, além da
regulação tarifária, a SEAE tem empreendido esforços no sentido de identificar
falhas em estruturas reguladoras vigentes, bem como em diversos setores, falhas
essas que induzem a um desempenho menos eficiente. Atua, ainda, promovendo a
desregulamentação, quando a atuação estatal traduzir-se em entraves
regulatórios à concorrência, observando-se que esta é um instrumento factível
para garantir eficiência, qualidade e preços condizentes com o nível de custos,
bem como, quando for o caso e se fizer necessário, a rerregulamentação.
5.5. Do papel da Advocacia Geral da
União junto ao CADE
O presente tópico cuida
do órgão que detém a capacidade postulatória para representar o CADE em juízo e
fora dele, bem como para prestar a atividade de consultoria jurídica ao ente.
Inicialmente, há que se ter em mente que, nos termos da atual Constituição da
República Federativa do Brasil, toda a atividade de representação judicial da
União e de consultoria de seu Executivo é atribuída, exclusivamente, à
Advocacia Geral da União.
A Advocacia Geral da
União – AGU – foi criada a partir da promulgação da Constituição Federal de
1988, com o objetivo de representar judicial e extrajudicialmente a União, além
de ser responsável pela Consultoria e Assessoramento do Poder Executivo,
diretamente ou por intermédio de seus órgãos vinculados, nos termos do artigo
131 da Constituição da República Federativa do Brasil e do artigo 29 dos Atos
das Disposições Constitucionais Transitórias.
No exercício de suas
atribuições a advocacia pública exerce função essencial à justiça, assim
definida na Carta Política. Outrossim, mister se faz esclarecer que a
representação judicial, extrajudicial, bem como as atividades de consultoria e
assessoramento jurídico da Administração Pública Indireta são exercidos por
órgão vinculado à Advocacia Geral da União, a saber a Procuradoria Geral
Federal, através de suas Procuradorias Federais, do artigo 17 e do artigo. 18
da Lei Complementar n. 73/1993, e do artigo 10 da Lei n. 10.480/2002.
Destarte, uma vez que a
capacidade postulatória da Administração Pública Federal Indireta é atribuição
legal da Procuradoria Geral Federal que a executa por intermédio de seus
membros de carreira, com competência expressa em lei para tanto, prescinde a
mesma de apresentação em Juízo de instrumento de mandato ou qualquer outro
documento.
Assim, resta claro que
o órgão jurídico atuante no CADE encontra-se em exercício descentralizado junto
ao mesmo, não guardando qualquer relação de subordinação hierárquica, tampouco
regime de vinculação técnica, uma vez que se trata de órgão vinculado à AGU,
nos termos do artigo 131 da CRFB, artigo 29 do ADCT, bem como da Lei
Complementar n. 73/1993 e da Lei n. 10.480/2002.
Em que pese para
nomeação do cargo de Advogado-Geral da União a Constituição da República apenas
exigir notório saber jurídico, reputação ilibada e idade mínima de 35 anos,
sendo livre nomeado e exonerado pelo Presidente da República, a Lei do CADE
estabeleceu critério diferenciado para a nomeação do Procurador-Chefe junto ao
CADE.
Assim, a indicação para
a chefia do órgão jurídico que atua junto ao CADE é atribuição do Ministro da
Justiça, devendo o mesmo ser nomeado pelo Presidente da República, após
aprovação mediante sabatina do Senado Federal, gozando das mesmas prerrogativas
de permanência no cargo dos Conselheiros do CADE, sendo escolhido dentre os
cidadãos brasileiros, com mais de 30 (trinta) anos, com notório saber jurídico
e reputação ilibada.
As licenças, assim como
as férias, serão requeridas pelo Procurador-Geral à Presidência, por escrito,
com a indicação do prazo e do dia do início, bem como com a sugestão de seu
substituto. O Procurador-Chefe poderá delegar aos Procuradores do CADE a
prática de atos que sejam de sua competência, nos termos do artigo 12, da Lei
n. 9.784/1999.
Aplicam-se aos
Procuradores do CADE, inclusive ao Procurador-Chefe, os motivos de impedimento
e suspeição aplicáveis aos Conselheiros do CADE, exceto quanto ao
comparecimento às sessões.
O Procurador-Chefe
poderá participar, sem direito a voto, das reuniões do Tribunal, prestando
assistência e esclarecimentos, quando requisitado pelos Conselheiros, na forma
do regimento interno do Tribunal. Nos casos de faltas, afastamento temporário
ou impedimento do Procurador-Chefe, o Plenário indicará e o Presidente do
Tribunal designará o substituto eventual.
5.6. Do papel do Ministério Público
Federal junto ao CADE
A intervenção do
Ministério Público Federal junto ao CADE deriva da natureza transindividual que
o mercado interno possui, quanto bem de titularidade da coletividade. Isto
decorre do próprio ordenamento constitucional que, em seu artigo 219, preceitua
que: “O mercado interno integra o
patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento
cultural e socioeconômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica
do País, nos termos de lei federal”. Assim, uma vez que, nos termos do
artigo 129, I e III, in fine, da CRFB, compete ao Ministério Público promover a
ação penal pública e a defesa dos direitos difusos e coletivos, justifica-se
sua atuação junto ao CADE.
Todavia, a própria Lei
de Proteção à Concorrência, por razões de constitucionalidade formal (vide o
artigo 128, § 5º, da CRFB), não disciplinou satisfatoriamente a participação do
Ministério Público Federal junto aos processos relativos à proteção à
concorrência de competência do CADE. Outrossim, igualmente por razões de
constitucionalidade e legalidade, o Regimento Interno do CADE (Resolução n.
12/1998) é silente quanto a atuação do Parquet.
Confunde-se, não raro,
tanto em doutrina quanto em jurisprudência, os papéis da Procuradoria Federal e
do Ministério Público junto ao CADE. Ao primeiro, são reservadas as
competências de advocacia de Estado, na qualidade de representante judicial e
extrajudicial, bem como de consultor jurídico. Por sua vez, ao segundo, incumbe
o papel de custous legis, no que se
refere à tutela dos interesses da coletividade, mediante propositura de ação
civil pública para tanto, bem como para o ajuizamento de ação penal pública,
havendo materialidade de fato que se traduza em crime contra a ordem econômica,
nos termos da Lei n. 8.137/1991, e indício suficiente de autoria.
Observe-se que, por
expressa vedação constitucional (art. 129, IX, in fine, CRFB), o Ministério
Público Federal encontra-se impedido de efetuar “a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades
públicas”. Nessa linha, não há como se conceber participação direta do MPF
nos feitos de competência do CADE, a não ser para a defesa do interesse da
coletividade e para a persecução penal nas condutas que materializem crimes
contra a ordem econômica, tudo em sede judicial própria. A Lei de Proteção à
Concorrência revela-se de constitucionalidade duvidosa, uma vez que prevê a
possibilidade, ainda que em caráter subsidiário, de o Ministério Público
Federal atuar em juízo, representando o CADE, quando sua Procuradoria não o
fizer.
Vale destacar, por fim,
que a inclusão de atribuições ao Ministério Público Federal em lei ordinária,
igualmente se revela de constitucionalidade formal duvidosa, uma vez que o
artigo 128, § 5º, da CRFB, faz expressa reserva de lei complementar para a
fixação de atribuições do Parquet.
Salvo melhor juízo, a
oitiva do Ministério Público Federal junto ao CADE revela-se pertinente no caso
de análise de condutas anticompetitivas, uma vez que muitas infrações da ordem
econômica, ilícito de natureza administrativa, podem caracterizar crime contra
a ordem econômica, ilícito de natureza penal, além, eventualmente, de violar
direitos consumeristas.
Defender que o Parquet opine nos feitos do CADE gera
duplicidade de manifestações jurídica, uma vez que a Constituição da República
expressamente veda tal atribuição ao Ministério Público e a Procuradoria Federal
junto ao CADE já cumpre com Excelência esse papel.
Outrossim, o CADE tem
natureza jurídica de autarquia federal sob regime especial, que exerce
atribuições normativas, executivas e judicantes, como as Agências Reguladoras,
o Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários. Em nenhum desses
entes a atuação do Ministério Público, que se revela despicienda, além de criar
mais uma etapa administrativa injustificável e de constitucionalidade duvidosa
no tramite do processo administrativo, fato que compromete a celeridade do
procedimento.
6. Do Processo Administrativo no âmbito
do SBPC
A vontade da
Administração Pública se manifesta através da edição de atos administrativos
editados por intermédio de seus diversos órgãos. Todavia, dada a complexidade
de determinadas competências da Administração Pública, a edição de um único ato
não basta para a persecução da vontade estatal, dependo de uma série de atos
prévios a serem praticados para tanto.
Denomina-se de
procedimento o rito, isto é, a ordenação legal e consecutiva de determinados
atos, praticados para a realização da vontade da Administração Pública.
Processo é o vínculo jurídico existente entre os sujeitos que demandam perante
o Poder Público, requisitando sua atuação, isto é, é a relação jurídica
existente entre pessoas que tem interesses necessitando de amparo e proteção e
os levam ao Estado com o fito de socorrê-los. Tal relação jurídica é denominada
de relação processual.
De tais conceitos,
podemos ver que procedimento nada mais é do que a forma de exteriorização da
relação processual.
Tendo em vista que o
Estado atua no exercício de seus fins constitucionais através de três funções
que lhe são típicas, a saber, Legislativos, Judiciário e Executivo, podemos
falar na existência do processo legislativo, processo judicial e processo
administrativo.
a) Processo
Legislativo é a relação jurídica processual existente entre os representantes
eleitos do povo e suas respectivas Casas Legislativas, compreendendo a
elaboração das espécies legislativas, delineadas no art 59 da Constituição da
República Federativa do Brasil. Procedimentalmente é o conjunto de atos
(iniciativa, emenda, votação, sanção e veto) realizados pelos órgãos
legislativos visando a produção de emendas a constituição, leis complementares,
ordinárias e delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e
resoluções. Observe-se que o vínculo existente entre os sujeitos (cidadãos) e o
Estado se dá de forma indireta, uma vez que, no que tange ao Legislativo, o
exercício deste poder/função é feito por intermédio de representantes eleitos
para tanto. Seu estudo é objeto do Direito Constitucional.
b) Processo
Judicial é a relação jurídica processual existente entre os litigantes e os
Órgãos do Poder Judiciário, isto é, a relação jurídica existente entre pessoas
que possuem pretensões antagônicas, interesses em conflito, deduzindo-as
perante o Estado/Juiz, com o fim de dirimi-las. Possui três espécies, a saber,
cognitivo, cautelar e de execução, podendo desenvolver-se por diversos ritos,
todos delineados em lei. Seu estudo é objeto do Direito Processual (Civil ou
Penal).
c) Processo
Administrativo é o vínculo jurídico existente entre os administrados e os
diversos órgãos que compõe a Administração Pública. Tem como característica a
ausência de eqüidistância e imparcialidade do órgão julgador, uma vez que o
Estado (Administração Pública) participa diretamente da relação processual, via
de regra, como ex adverso. Seu objeto de estudo compete ao Direito
Administrativo, havendo diversas previsões constitucionais sobre o mesmo (art.
5º, LV e LXXVIII; art. 37, XXI; art. 41, §1º).
Consoante expressas
disposições constitucionais:
Art. 5º (...)
LV - aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla
defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
LXXVIII a todos, no âmbito judicial e
administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que
garantam a celeridade de sua tramitação.
Art. 41. (...)
§ 1º O servidor público estável só perderá o cargo:
I - em virtude de sentença judicial transitada em
julgado;
II – mediante processo administrativo em que lhe
seja assegurada ampla defesa;
III – mediante procedimento de avaliação periódica
de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa.
Nos termos acima,
verifica-se que a manifestação de vontade estatal reger-se pelo princípio do
devido processo legal. Trata-se de instituto jurídico que se traduz no direito
fundamental que tutela, disciplina, limita e procedimentaliza a forma pela qual
o Poder Público irá interferir na esfera de domínio privado do indivíduo.
Segundo Carlos Roberto Siqueira Castro trata-se do “direito público subjetivo à tutela jurisdicional isonômica e
imparcial”.
Tal instituto pode ser
apreciado em suas duas vertentes processuais, a saber: a) devido processo legal
penal: é o equilíbrio entre o ius
puniendi e o ius libertatis, no
qual nenhum indivíduo será privado de sua liberdade sem a devida observância do
trâmite adequado para tanto; b) devido processo legal civil: é o instrumento de
tutela isonômica do direito de ação e da garantia de defesa em Juízo, no qual
nenhum indivíduo será privado de seus bens, tampouco compelido a fazer ou
deixar de fazer algo, senão por ordem da autoridade estatal competente,
mediante a observância do trâmite adequado para tanto.
Suas origens históricas
montam aos primórdios do direito constitucional anglo-saxão. Em 1.215, o art.
39 da Constituição do Rei João sem terra (príncipe regente de Ricardo Coração de
Leão) determinava que nenhum homem livre seria privado de suas propriedades sem
a observância da law of the land (lei
da terra). No ano de 1.352, a referida constituição foi emendada por Eduardo
III que deu nova redação ao art. 39, introduzindo a expressão due process of law.
Por sua vez, em 1.787,
a Convenção da Filadélfia consagrou o modelo federativo e a soberania da União
dos 13 Estados Independentes, antigas colônias britânicas. O traço
característico do Bill of Rights foi
de estabelecer limites à função Legislativa por parte do Executivo (veto
presidencial) e pelo Judiciário (judicial
review). Assim, consagrou-se a forma presidencialista de governo, como
resposta ao modelo parlamentarista inglês. Outrossim, o texto original do Bill of Rights era omisso no que tange
aos direitos e garantias fundamentais, sendo incorporados a posteriori. A 5ª emenda incorporou ao Direito Constitucional
norte-americano os seguintes direito fundamentais: a) due process of law: ninguém será privado de seus bens ou liberdade
sem o devido processo legal (garantia da justa indenização na desapropriação
para uso público); b) trial by jury (jury
trial): direito ao julgamento por júri independente e imparcial; c) no self incrimination: vedação à auto
incriminação forçada (produção de provas contra si mesmo); d) doble jeopardy: proibição ao duplo
julgamento pelo mesmo fato; e) ex post
facto law: proibição da retroatividade das leis; f) bill of attainder: vedação a julgamentos sumários.
Com a 6ª emenda, consagrou-se o direito de defesa e de contraditório como
corolário do devido processo legal, traduzido na faculdade de inquirir e
confrontar testemunhas, na possibilidade de arrolar testemunhas para defesa e
no direito a ser assistido por um advogado. Outrossim, incorporou-se o speedy
and public trial, que é direito a um julgamento célere e público, bem como
o fair notice, que se traduz no direito de ser informado sobre a
natureza e sobre a identidade da autoridade em caso de acusação. Por sua vez, a
9ª emenda trouxe as seguintes inovações: a) conhecimento prévio das provas de
acusação; b) direito de permanecer em silêncio perante a autoridade policial;
c) direito de ser assistido por advogado dativo em caso de notada
hipossuficiência. Com a 14ª emenda, efetivou-se a garantia de acesso à
jurisdição, como corolário do devido processo legal.
A Lei de Proteção à
Concorrência regula os seguintes procedimentos administrativos instaurados para
prevenção, apuração e repressão de infrações à ordem econômica:
a) procedimento
preparatório de inquérito administrativo para apuração de infrações à ordem
econômica;
b) inquérito
administrativo para apuração de infrações à ordem econômica;
c) processo
administrativo para imposição de sanções administrativas por infrações à ordem
econômica;
d) processo administrativo para análise de ato de
concentração econômica;
e) procedimento
administrativo para apuração de ato de concentração econômica; e
f) processo
administrativo para imposição de sanções processuais incidentais.
Os feitos
administrativos de procedimento preparatório, de inquérito administrativo e de
processo administrativo para apuração de infrações à ordem econômica, tem
assegurado pelo Tribunal e pela Superintendência-Geral o tratamento sigiloso de
documentos, informações e atos processuais necessários à elucidação dos fatos
ou exigidos pelo interesse da sociedade. As partes interessadas poderão, ainda,
requerer tratamento sigiloso de documentos ou informações, no tempo e modo
definidos no regimento interno do CADE.
A intervenção poderá
ser admitida pela Superintendência-Geral ou pelo Conselheiro-Relator no
processo administrativo de:
a) terceiros
titulares de direitos ou interesses que possam ser afetados pela decisão a ser
adotada; ou
b) legitimados
à propositura de ação civil pública pelos incisos III e IV do art. 82 da Lei nº
8.078, de 11 de setembro de 1990.
Na tramitação dos
processos no CADE, serão observadas as seguintes disposições:
a) os atos de
concentração terão prioridade sobre o julgamento de outras matérias;
b) a sessão de
julgamento do Tribunal é pública, salvo nos casos em que for determinado
tratamento sigiloso ao processo, ocasião em que as sessões serão reservadas;
c) nas sessões
de julgamento do Tribunal, poderão o Superintendente-Geral, o Economista-Chefe,
o Procurador-Chefe e as partes do processo requerer a palavra, que lhes será
concedida, nessa ordem, nas condições e no prazo definido pelo regimento
interno, a fim de sustentarem oralmente suas razões perante o Tribunal;
d) a pauta das
sessões de julgamento será definida pelo Presidente, que determinará sua
publicação, com pelo menos 120 (cento e vinte) horas de antecedência; e
e) os atos e
termos a serem praticados nos autos dos procedimentos acima enumerados poderão
ser encaminhados de forma eletrônica ou apresentados em meio magnético ou
equivalente, nos termos das normas do CADE.
O cumprimento das
decisões do Tribunal e de compromissos e acordos firmados nos termos da Lei de
Proteção à concorrência será fiscalizado pela Superintendência-Geral, a quem
deverão ser encaminhados os autos dos processos após a decisão final do
Tribunal. A Superintendência-Geral deverá apresentar ao Tribunal e ao
Procurador-Chefe, em periodicidade definida em resolução do CADE, relatório a
respeito dos processos acima referidos, assegurado a estas autoridades
requerer, a qualquer tempo, informações. Na fase de fiscalização da execução
das decisões do Tribunal, bem como do cumprimento de compromissos e acordos
firmados nos termos da Lei de Proteção à Concorrência, poderá a
Superintendência-Geral valer-se de todos os poderes instrutórios que lhe são
assegurados na legislação vigente.
Cumprida integralmente
a decisão do Tribunal ou os acordos em controle de concentrações e compromissos
de cessação, a Superintendência-Geral, de ofício ou por provocação do interessado,
manifestar-se-á sobre seu cumprimento.
7. Do processo administrativo no
controle de atos de concentração econômica
Serão submetidos ao
CADE pelas partes envolvidas na operação os atos de concentração econômica em
que, cumulativamente:
a) pelo menos
um dos grupos envolvidos na operação tenha registrado, no último balanço,
faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à
operação, equivalente ou superior a R$ 400.000.000,00 (quatrocentos milhões de
reais); e
b) pelo menos
um outro grupo envolvido na operação tenha registrado, no último balanço,
faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à
operação, equivalente ou superior a R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais).
Os valores acima
mencionados poderão ser adequados, simultânea ou independentemente, por
indicação do Plenário do CADE, por portaria interministerial dos Ministros de
Estado da Fazenda e da Justiça.
O controle dos atos de
concentração será prévio e realizado em, no máximo, 240 (duzentos e quarenta)
dias, a contar do protocolo de petição ou de sua emenda.
Os atos que se
subsumirem nos quesitos legais acima não podem ser consumados antes de
apreciados, nos termos deste artigo e do procedimento previsto na Lei de
Proteção à Concorrência, sob pena de nulidade, sendo ainda imposta multa
pecuniária, de valor não inferior a R$ 60.000,00 (sessenta mil Reais) nem
superior a R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de Reais), a ser aplicada nos
termos da regulamentação, sem prejuízo da abertura de processo administrativo.
Até a decisão final
sobre a operação, deverão ser preservadas as condições de concorrência entre as
empresas envolvidas, sob pena de aplicação das sanções acima mencionadas. Serão
proibidos os atos de concentração que impliquem eliminação da concorrência em
parte substancial de mercado relevante, que possam criar ou reforçar uma
posição dominante ou que possam resultar na dominação de mercado relevante de
bens ou serviços, ressalvada a possibilidade de celebração de acordo para
aprovação do mesmo. Para tanto, tais atos a que poderão ser autorizados, desde
que sejam observados os limites estritamente necessários para atingir os
seguintes objetivos: I - cumulada ou alternativamente: a) aumentar a
produtividade ou a competitividade; b) melhorar a qualidade de bens ou
serviços; ou c) propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou
econômico; e II – sejam repassados aos consumidores parte relevante dos
benefícios decorrentes.
É facultado ao Cade, no
prazo de 1 (um) ano a contar da respectiva data de consumação, requerer a
submissão dos atos de concentração que não se enquadrem no disposto na Lei de
Proteção Á Concorrência.
As mudanças de controle
acionário de companhias abertas e os registros de fusão, sem prejuízo da obrigação
das partes envolvidas, devem ser comunicados ao CADE pela Comissão de Valores
Mobiliários - CVM e pelo Departamento Nacional do Registro do Comércio do
Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, respectivamente,
no prazo de 5 (cinco) dias úteis para, se for o caso, ser examinados.
O prazo de 240 dias
previsto na legislação somente poderá ser dilatado: a) por até 60 (sessenta)
dias, improrrogáveis, mediante requisição das partes envolvidas na operação; ou
b) por até 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada do Tribunal, em que
sejam especificados as razões para a extensão, o prazo da prorrogação, que será
não renovável, e as providências cuja realização seja necessária para o
julgamento do processo.
O Cade regulamentará,
por meio de Resolução, a análise prévia de atos de concentração realizados com
o propósito específico de participação em leilões, licitações e operações de
aquisição de ações por meio de oferta pública.
Nos termos da
legislação vigente, realiza-se um ato de concentração quando: a) 2 (duas) ou
mais empresas anteriormente independentes se fundem; b) 1 (uma) ou mais
empresas adquirem, direta ou indiretamente, por compra ou permuta de ações,
quotas, títulos ou valores mobiliários conversíveis em ações, ou ativos, tangíveis
ou intangíveis, por via contratual ou por qualquer outro meio ou forma, o
controle ou partes de uma ou outras empresas; c) 1 (uma) ou mais empresas
incorporam outra ou outras empresas; ou, ainda, d) 2 (duas) ou mais empresas
celebram contrato associativo, consórcio ou joint
venture.
Não serão consideradas
atos de concentração, as transações e as negociações de ações, quotas ou outros
títulos, por conta própria ou de terceiros, em caráter temporário, ou
participações adquiridas para fins de revenda, desde que os adquirentes: a) não
detenham o poder de determinar, direta ou indiretamente, ou ainda a capacidade
de influenciar o comportamento concorrencial da empresa adquirida; ou b) apenas
exerçam o direito de voto com o objetivo exclusivo de preparar a alienação,
total ou parcial, da empresa adquirida, seus ativos ou dessas participações,
devendo tal alienação ocorrer no prazo regulamentar.
A aprovação do ato de
controle de concentrações poderá ser revista pelo Tribunal, de ofício ou
mediante provocação da Superintendência-Geral, se a decisão for baseada em
informações falsas ou enganosas prestadas pelo interessado, se ocorrer o
descumprimento de quaisquer das obrigações assumidas ou não forem alcançados os
benefícios visados. Nesta hipótese, a falsidade ou enganosidade será punida com
multa pecuniária, de valor não inferior a R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) nem
superior a R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais), a ser aplicada na forma das
normas do CADE, sem prejuízo da abertura de processo administrativo e da adoção
das demais medidas cabíveis.
7.1. Do Procedimento junto a
Superintendência-Geral
O
pedido de aprovação dos atos de concentração econômica deverá ser endereçado ao
CADE, devidamente instruído com as informações e documentos indispensáveis à
instauração do processo administrativo, assim definidos em resolução do CADE,
além do comprovante de recolhimento da taxa respectiva.
Verificando-se,
no prazo de 5 (cinco) dias úteis após o protocolo do pedido, que a petição não
preenche os requisitos exigidos ou que apresenta defeitos e irregularidades
capazes de dificultar o julgamento de mérito, a Superintendência-Geral
determinará, uma única vez, que os requerentes a emendem, no prazo de 10 (dez)
dias úteis, sob pena de arquivamento.
A
Superintendência-Geral fará publicar edital, indicando o nome dos requerentes,
a natureza da operação e os setores econômicos envolvidos, no prazo de 5
(cinco) dias úteis após o protocolo da apresentação do ato de concentração ou
de sua emenda.
Em
até 20 (vinte) dias úteis, a Superintendência-Geral, contados da data de
apresentação do ato de concentração ou de sua emenda:
a) conhecerá
diretamente do pedido, proferindo decisão, quando o processo dispensar novas
diligências ou nos casos de menor potencial ofensivo à concorrência, assim
definidos em resolução do CADE; ou
b) determinará
a realização da instrução complementar, especificando as diligências a serem
produzidas.
A
Superintendência-Geral, em até 5 (cinco) dias úteis, contados da data da
conclusão da instrução complementar acima mencionada, deverá manifestar-se
sobre seu satisfatório cumprimento, recebendo-as como adequadas ao exame de
mérito ou determinando sejam refeitas, por incompletas.
Em
até 50 (cinqüenta) dias úteis da data de apresentação do ato de concentração ou
de sua emenda, a Superintendência-Geral poderá emitir decisão fundamentada
declarando a operação como complexa e determinará a realização de instrução
complementar, especificando as diligências a serem produzidas. A instrução
complementar acima referida deverá estar concluída em até 90 (noventa) dias
úteis da apresentação do ato de concentração ou de sua emenda. Não havendo
declaração de que a operação seja complexa, a Superintendência-Geral deverá em
até 60 (sessenta) dias úteis da apresentação do ato de concentração ou de sua
emenda proferirá sua decisão.
Concluídas
as instruções complementares acima mencionadas, a Superintendência-Geral em até
10 (dez) dias úteis:
a) proferirá
decisão aprovando o ato sem restrições;
b) oferecerá
impugnação perante o Tribunal, caso entenda que o ato deva ser rejeitado,
aprovado com restrições ou que não existam elementos conclusivos quanto aos
seus efeitos no mercado.
Na
impugnação do ato perante o Tribunal, deverão ser demonstrados, de forma
circunstanciada, o potencial lesivo do ato à concorrência e as razões pelas
quais não deve ser aprovado integralmente ou rejeitado.
7.2. Do Procedimento junto ao Tribunal
O requerente poderá
oferecer, no prazo de 30 (trinta) dias da data de impugnação da
Superintendência-Geral, em petição escrita, dirigida ao Presidente do Tribunal,
manifestação expondo as razões de fato e de direito com que se opõe à
impugnação do ato de concentração da Superintendência-Geral e juntando todas as
provas, estudos e pareceres que corroboram seu pedido. Em até 48 (quarenta e
oito) horas da decisão de que trata a impugnação pela Superintendência-Geral o
processo será distribuído, por sorteio, a um Conselheiro-Relator.
No prazo de 20 (vinte)
dias úteis contado da apresentação da manifestação pelo Requerente, o
Conselheiro-Relator:
a) proferirá
decisão determinando a inclusão do processo em pauta para julgamento, caso
entenda que se encontre suficientemente instruído;
b) determinará
à Superintendência-Geral, por meio de decisão fundamentada, a realização de
instrução complementar, declarando os pontos controversos e especificando as
diligências a serem produzidas, podendo acompanhar a execução das mesmas.
O Conselheiro-Relator
poderá autorizar, conforme o caso, precária e liminarmente, a realização do ato
de concentração econômica, impondo as condições que visem à preservação da
reversibilidade da operação, quando assim recomendarem as condições do caso
concreto.
Se entender concluída a
instrução complementar, em até 30 (trinta) dias úteis contados a partir do
recebimento pelo Tribunal do relatório com a conclusão da instrução
complementar elaborada pela Superintendência-Geral, o Conselheiro- Relator
determinará a inclusão do processo em pauta para julgamento.
No julgamento do pedido
de aprovação do ato de concentração econômica, o Tribunal poderá aprová-lo
integralmente, rejeitá-lo ou aprová-lo parcialmente, caso em que determinará as
restrições que deverão ser observadas como condição para a validade e eficácia
do ato.
O Tribunal determinará
as restrições cabíveis no sentido de mitigar os eventuais efeitos nocivos do
ato de concentração sobre os mercados relevantes afetados, incluindo:
a) a venda de
ativos ou de um conjunto de ativos que constitua uma atividade empresarial;
b) a cisão de
sociedade;
c) a alienação
de controle societário;
d) a separação
contábil ou jurídica de atividades;
e) o
licenciamento compulsório de direitos de propriedade intelectual; e
f) qualquer
outro ato ou providência necessários para a eliminação dos efeitos nocivos à
ordem econômica.
A decisão proferida
pelo Tribunal faz preclusão administrativa. Assim, julgado o processo no
mérito, o ato de concentração não poderá ser novamente apresentado nem revisto
no âmbito do Poder Executivo.
Em caso de recusa,
omissão, enganosidade, falsidade ou retardamento injustificado, por parte dos
requerentes, de informações ou documentos cuja apresentação for determinada
pelo CADE, sem prejuízo das demais sanções cabíveis, poderá o pedido de
aprovação do ato de concentração ser rejeitado por falta de provas, caso em que
o requerente somente poderá realizar o ato mediante apresentação de novo pedido
Os prazos previstos
para os processos de controle de atos de concentração econômica não se
suspendem ou interrompem por qualquer motivo, ressalvado os casos de ausência
de quórum mínimo para deliberação no Plenário e de análise dos pedidos de
acordo em controle de concentrações.
O descumprimento dos
prazos para análise dos atos de concentração econômica poderá implicar na
aprovação tácita dos mesmos, sem prejuízo da imediata apuração das
responsabilidades penal, cível e administrativa de quem lhe deu causa.
7.3. Do Recurso contra Decisão de
Aprovação do Ato pela Superintendência-Geral
No prazo de 15 (quinze)
dias contado a partir da publicação da decisão da Superintendência-Geral que
aprovar o ato de concentração, seja de forma liminar, quando dispensar a
realização de instrução, seja de forma definitiva, por ocasião do encerramento
das diligências complementares:
a) caberá
recurso da decisão ao Tribunal, que poderá ser interposto por terceiros
interessados ou, em se tratando de mercado regulado, pela respectiva agência
reguladora;
b) o Tribunal
poderá, mediante provocação de um de seus Conselheiros e em decisão
fundamentada, avocar o processo para julgamento ficando prevento o Conselheiro
que encaminhou a provocação.
Em até 5 (cinco) dias
úteis a partir do recebimento do recurso, o Conselheiro-Relator:
a) conhecerá
do recurso e determinará a sua inclusão em pauta para julgamento;
b) conhecerá
do recurso e determinará à Superintendência-Geral a realização de instrução
complementar, declarando os pontos controversos e especificando as diligências
a serem produzidas; ou
c) não
conhecerá do recurso, determinando o seu arquivamento.
As requerentes poderão
manifestar-se acerca do recurso interposto, em até 5 (cinco) dias úteis do
conhecimento do recurso no Tribunal ou da data do recebimento do relatório com
a conclusão da instrução complementar elaborada pela Superintendência-Geral, o
que ocorrer por último.
Em até 20 (vinte) dias
úteis contados a partir da conclusão da instrução complementar elaborada pela
Superintendência- Geral, o Conselheiro-Relator determinará a inclusão do
processo em pauta para julgamento, se entender concluída a instrução.
O litigante de má-fé
arcará com multa, em favor do Fundo de Defesa de Direitos Difusos, a ser
arbitrada pelo Tribunal entre R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e R$ 5.000.000,00
(cinco milhões de reais), levando-se em consideração sua condição econômica,
sua atuação no processo e o retardamento injustificado causado à aprovação do
ato.
A interposição do
recurso ou a decisão de avocar suspende a execução do ato de concentração
econômica até decisão final do Tribunal.
7.4. Do Acordo em Controle de
Concentrações
Os atos que, sob qualquer
forma, possam limitar ou, ainda, prejudicar a livre-concorrência, ou resultar
na dominação de mercados relevantes de bens ou serviços, devem ser submetidos à
apreciação do CADE. Todavia, nem sempre a prática de tal ato revela-se
perniciosa ao mercado, traduzindo-se, muitas vezes, em medida necessária para a
sustentabilidade racional do mesmo.
Poderão, assim, ser
autorizados pelo Tribunal Administrativo de Defesa da Concorrência os atos que
concentração que promovam a eficiência econômica e o bem-estar dos
consumidores, bem como aqueles cujos benefícios não possam ser obtidos de outro
modo que implique menores restrições ou prejuízos à livre concorrência e,
ainda, compensem as restrições causadas à livre concorrência, devendo ser
compartilhados entre os seus participantes e os consumidores ou usuários
finais.
Para tanto,
Superintendência-Geral poderá, na forma previamente fixada pelo Tribunal, antes
de impugnar a operação, negociar, com a participação do respectivo
Conselheiro-Relator, acordo com os interessados que submetam atos a exame, de
modo a assegurar o cumprimento das condições legais para a respectiva
aprovação.
Uma vez negociado o
acordo, minuta de seu inteiro teor deverá ser disponibilizada para consulta
pública por prazo não inferior a 10 (dez) dias, devendo as respectivas
manifestações merecer apreciação motivada.
Constarão dos acordos
em controle de concentrações as cláusulas necessárias à eliminação dos efeitos
nocivos à ordem econômica, devendo ser estabelecidos prazos pré definidos para
o seu cumprimento, que será fiscalizado pela Superintendência-Geral.
O descumprimento do
acordo referido implicará a revisão da respectiva aprovação pelo CADE e a
abertura de processo administrativo para a adoção das demais medidas cabíveis.
O acordo negociado pela
Superintendência-Geral deverá ser submetido à aprovação do Tribunal, que
deliberará no prazo de 30 (trinta) dias úteis, suspendendo-se os prazos de
análise dos atos de concentração.
7.5. Da aprovação dos atos de
concentração em virtude do tempo
Uma das
inovações na atual Lei do CADE (nº 12.529, de 2001) que gerou maior polêmica
foi a possibilidade de aprovação tácita dos atos de concentração em virtude do
decurso dos prazos legais previstos na legislação para tanto.
Pela
redação original do art. 64 constante no projeto de lei, todo e qualquer
descumprimento de prazo previsto na lei acarretaria a aprovação automática dos
processos de análise dos atos de concentração:
Art. 64. O descumprimento dos
prazos previstos nesta Lei implica a aprovação tácita do ato de concentração
econômica.
Parágrafo único. Comprovada nos
autos a aprovação tácita a que se refere o caput deste artigo, deverá ser
providenciada a imediata apuração das responsabilidades penal, cível e
administrativa de quem lhe deu causa.
Em virtude
de possíveis interpretações in malam
parte à Administração Pública, o referido dispositivo restou vetado pela
Presidência da República, nos termos da Mensagem nº 536, de 30 de novembro de
2011, cujas razões são descritas a seguir:
“Da forma como redigido, o artigo estabelece a aprovação tácita de atos
de concentração como consequência automática do descumprimento de quaisquer dos
prazos estabelecidos pela lei, resultando em medida desproporcional e com o
potencial de acarretar graves prejuízos à sociedade. Note-se que a legislação
já oferece mecanismos menos gravosos e aptos a apurar as responsabilidades pelo
eventual desrespeito aos prazos estabelecidos em lei.”
Todavia, em
que pese o veto presidencial acima, o plenário do Conselho Administrativo de
Defesa Econômica aprovou, por unanimidade, durante a 508ª Sessão de Julgamento
realizada em 08 de fevereiro de 2012, o Parecer nº 12/2012/PROCADE/PGF/AGU, da
lavra do Procurador-Chefe Gilvandro Araújo, que esclarece e fixa a
interpretação da autarquia acerca do veto presidencial ao ar. 64 da Lei nº 12.529,
de 2011.
De acordo
com o parecer acima, a aprovação de atos de concentração econômica será
automática nos casos de decurso dos prazos peremptórios fixados na lei para
avaliação dos processos. Isto porque, de acordo com o entendimento adotado
pelas autoridades concorrenciais brasileiras o referido o veto presidencial não
se aplica aos prazos próprios, determinados na legislação de proteção a
concorrência para conclusão da análise dos processos referentes aos atos de
concentração de mercados, restringindo-se, tão somente, aos prazos impróprios e
genéricos. Assim, não haverá possibilidade de aprovação automática por decurso
de todo e qualquer prazo fixado em lei, mas apenas daqueles que estabelecem o
tempo máximo e improrrogável para tanto.
Portanto, o
entendimento dominante no âmbito do CADE é de que se o prazo estipulado para
análise das operações de fusão e aquisição, a saber, 240 dias, prorrogáveis por
mais 90, for descumprido pela Administração Pública, as operações serão
aprovadas tacitamente. A regra não se aplicará, por óbvio, a outros prazos,
como o de distribuição dos processos aos conselheiros.
Para tanto,
o órgão jurídico fixou interpretação histórica, teleológica e sistemática da
Lei nº 12.529, de 2011, cotejando seus dispositivos com os que restaram
revogados na Lei nº 8.884, de 1994.
Segundo a
Procuradoria do CADE, a regra de aprovação tácita e automática já se encontrava
presente na legislação anterior, nos termos do antigo art. 54, §§ 6º, 7º, 8º e
9º, da Lei nº 8.884, de 1994, a seguir transcritos, com a redação que lhe foi
dada pela Lei nº 9.021, de 1995:
Art. 54. Os atos, sob qualquer forma manifestados, que possam limitar ou
de qualquer forma prejudicar a livre concorrência, ou resultar na dominação de
mercados relevantes de bens ou serviços, deverão ser submetidos à apreciação do
CADE.
(...)
§ 6º Após receber o parecer técnico da Seae, que será emitido em até
trinta dias, a SDE manifestar-se-á em igual prazo, e em seguida encaminhará o
processo devidamente instruído ao Plenário do CADE, que deliberará no prazo de
sessenta dias. (Redação dada pela Lei nº 9.021, de 30.3.95)
§ 7º A eficácia dos atos de que trata este artigo condiciona-se à sua
aprovação, caso em que retroagirá à data de sua realização; não tendo sido
apreciados pelo CADE no prazo estabelecido no parágrafo anterior, serão
automaticamente considerados aprovados. (Redação dada pela Lei nº 9.021, de
30.3.95)
§ 8º Os prazos estabelecidos nos §§ 6º e 7º ficarão suspensos enquanto
não forem apresentados esclarecimentos e documentos imprescindíveis à análise
do processo, solicitados pelo CADE, SDE ou SPE.
§ 9º Se os atos especificados neste artigo não forem realizados sob
condição suspensiva ou deles já tiverem decorrido efeitos perante terceiros,
inclusive de natureza fiscal, o Plenário do CADE, se concluir pela sua não
aprovação, determinará as providências cabíveis no sentido de que sejam
desconstituídos, total ou parcialmente, seja através de distrato, cisão
desociedade, venda de ativos, cessação parcial de atividades ou qualquer outro
ato ou providência que elimine os efeitos nocivos à ordem econômica,
independentemente da responsabilidade civil por perdas e danos eventualmente
causados a terceiros.
Ainda
segundo o órgão jurídico, a atual legislação é expressa ao fixar o prazo
máximo, de natureza peremptória, para conclusão da análise dos atos de
concentração de mercado, a teor do disposto no art. 88, §§ 2º e 9º, a seguir
transcritos:
Art. 88. Serão submetidos ao Cade
pelas partes envolvidas na operação os atos de concentração econômica em que,
cumulativamente:
(...)
§ 2o O controle dos atos de concentração de que trata o caput deste
artigo será prévio e realizado em, no máximo, 240 (duzentos e quarenta) dias, a
contar do protocolo de petição ou de sua emenda.
(...)
§ 9o O prazo mencionado no § 2o
deste artigo somente poderá ser dilatado:
I - por até 60 (sessenta) dias, improrrogáveis, mediante requisição das
partes envolvidas na operação; ou
II - por até 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada do
Tribunal, em que sejam especificados as razões para a extensão, o prazo da
prorrogação, que será não renovável, e as providências cuja realização seja
necessária para o julgamento do processo.
Conforme
interpretação fixada pela Procuradoria do CADE o veto presidencial refere-se
apenas aos prazos periféricos, incidentais e genéricos, que são impróprios por
essência, não tendo o condão de atingir os prazos procedimentais principais,
específicos e improrrogáveis, que foram introduzidos na legislação como
mecanismos de garantia de celeridade e eficiência, mormente por haver expressa
vedação a suspensão ou interrupção dos mesmos, nos termos do art. 63 da Lei nº
12.529, de 2011, a seguir transcrito:
Art. 63. Os prazos previstos neste
Capítulo não se suspendem ou interrompem por qualquer motivo, ressalvado o
disposto no § 5o do art. 6o desta Lei, quando for o caso.
Assim,
conforme conclusão do referido órgão jurídico:
“38. Não é razoável supor que, descumprido o prazo legal de análise pela
própria Administração, as partes que exerceram legitimamente direitos
assegurados pela Constituição permaneçam indefinidamente sem pronunciamento ou
que o mesmo seja considerado negado. 39 A reprovação do ato de concentração
agora, depende, em primeiro lugar, da impugnação do ato pelo
Superintendente-Geral do CADE (art. 57 da Lei 12.529/2011), e, em segundo
lugar, da aceitação da impugnação pelo Tribunal do CADE, ou seja, de atos
comissivos da Administração. 40. Ora, se não tiver havido, dentro do prazo
geral de análise, a apreciação final do ato pelo Tribunal, não há porque se
presumir, contra o administrado, a existência de prejuízos decorrentes da
operação”.
Somado a
isso, a Procuradoria do CADE demonstrou que se a finalidade da reforma da Lei
do CADE foi conferir maior eficiência e celeridade as autoridades
concorrenciais brasileiras, não há como se dar ao veto presidencial ao art. 64
acima citado o condão de tornar impróprios todos os prazos peremptórios fixados
na Lei nº 12.529, de 2011, deturpando toda a ratio da atual legislação em prejuízo ao administrado.
Tal posicionamento se
coaduna, salvo melhor juízo, com o direito ao speed trial, introduzido no sistema constitucional pátrio via
Emenda Constitucional nº 45, de 2004, que, dentre tantas inovações, acrescentou
ao art. 5º, o inciso LXXVIII, a seguir transcrito: “(...) a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios
que garantam a celeridade de sua tramitação” – grifamos.
Ante
todo exposto, resta claro que o entendimento adotado pela Procuradoria Federal
junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica encontra amparo no atual
texto constitucional, mormente com a introdução expressa do direito ao speed trial por intermédio da Emenda
Constitucional nº 45, de 2004, que acresceu ao art. 5º o inciso LXXVIII. Por
sua vez, a própria Constituição impõe a Administração Pública o princípio da
eficiência como norte inafastável no exercício de suas atribuições, a teor do
art. 37, caput.
Em que pese não ser um
posicionamento simpático aos olhos da doutrina em geral, não há, a princípio e
salvo melhor juízo, quaisquer incompatibilidades, materiais, tampouco formais,
com os princípios que norteiam nossa Constituição da República, para fins de se
invocar eventual inconstitucionalidade, ainda que em sede de controle difuso e
concreto.
Conforme
recomendação feita pela Procuradoria Federal junto ao CADE, há que ser previsto
no Regimento Interno todo o procedimento há ser cumprido e observado para que o
ato de concentração de mercado seja considerado aprovado pelo decurso de tempo,
bem como para eventual apuração de responsabilidade, se for o caso.
Todavia,
ante a polêmica gerada em torno do alcance dos efeitos do veto presidencial, a
questão está longe de chegar a um consenso em ser pacificada, devendo, ainda,
ser objeto de calorosos debates.
9. Bibliografia
FIGUEIREDO, Leonardo Vizeu. Lições de direito econômico. 5.
ed. Rio de Janeiro, 2012.
FRANCESCHINI, José Inácio Gonzaga. Introdução ao direito da concorrência.
São Paulo: Malheiros Editores, 1996.
________. Lei da concorrência conforme interpretada pelo CADE. São Paulo:
Singular, 1998.
________. Direito da concorrência. Case law.
São Paulo: Singular, 2001.GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na
Constituição de 1988. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
Lei
e Política de Concorrência no Brasil. Uma Revisão dos Pares.
OECD e Interamerican Development Bank, 2005.
OLIVEIRA, Gesner; RODAS, João Grandino. Direito e economia da concorrência. São
Paulo: Renovar, 2004.
SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito
concorrencial: as estruturas. São Paulo: Malheiros, 2003.
_______. Direito concorrencial:
as condutas. São Paulo: Malheiros, 2003.
[1] Diretrizes para Elaboração e Implementação de Política de Defesa da Concorrência.
The World Banl, OCDE, Editora Singular, 2002 (original em inglês de 1998).